segunda-feira, 30 de maio de 2011

Resumo do texto de Cupani – A tecnologia como problema filosófico: três enfoques

Resumo do texto de Cupani – A tecnologia como problema filosófico: três enfoques

Por Djalma Gonçalves Pereira

Entendo a Filosofia como uma prática saudável de exercitar a reflexão dos fundamentos da vida. É um recurso que promove a abertura de espaços mentais nunca acionados anteriormente e ao mesmo tempo uma navalha que talha e marca nossa alma com suspeitas que não aceitam ser ignoradas, precisam ser solucionadas, e é essa busca por soluções que a Filosofia promove prioritariamente.
Ao ler Cupani e sua apresentação Filosófica dos três enfoques da tecnologia, percebo que ainda estamos longe de possuir uma verdade a respeito do uso das tecnologias e de seus processos. Existe muito a se conhecer, a se pensar, a se preparar, antes de termos as tecnologias verdadeiramente em favor de nossas vidas.
Bunge, com sua clareza, descreve a tecnologia como uma maneira de aprimoramento da existência humana, sendo a própria tecnologia objeto de superação de diferenças e injustiças, sendo ela aplicada com uma política adequada e com o uso da ética, trata-se de uma ferramenta que promove mecanismos de superação.
Fica clara a influência sofrida por Bunge das ideias do Iluminismo e do Libertismo clássico, em suas propostas que traz uma Filosofia otimista tudo faz muito sentido e fica muito convincente.
É ponto de questionamento em suas ideias a incapacidade de perceber que a tecnologia é capaz de desestruturar a cultura onde é introduzida, nesse sentido, Bunge pressupõe baseado no Iluminismo, que toda tradição equivale ao atraso e de que toda cultura não é científica e de algum modo defeituosa.
Já Borgmann, com sua abordagem fenomenológica, define a tecnologia como algo que perpassa, define e dirige a existência humana, tornando-nos cúmplices da tecnologia e assim nos tornado responsáveis pelo domínio que ela exerce sobre nós e nossas vidas.
Sua visão subestima os fatores sociais envolvidos com a tecnologia, destacando que os dominados nem sequer percebem sua capacidade de produzir mudanças, que se manifesta através de nossa atitude ambivalente frente a tecnologia, onde oscilamos entre o fascínio e a desconfiança.
Para que o homem não seja abandonado a mercê da tecnologia ou das estruturas sociais, precisa mobilizar-se e rejeitar aquilo que o prejudica, abandonando para isso sua cumplicidade com a tecnologia, mobilizando as pessoas para a força do exemplo e do cultivo de interesses chamados focais por Borgmann.
Os argumentos de Borgmann alertam para um problema, mas não consegue apontar diretamente para o mesmo, ficando um vazio teórico perceptível.
Na abordagem de Feenberg, a tecnologia é reconhecida como instrumento sociopolítico, e critica Borgmann por afirmar que a tecnologia é perfeita a seu modo.
Feenberg defende que produtos, mecanismos e soluções tecnológicas não respondem a sua eficiência inerente, mas a uma eficiência construída por interesses sociais. Esses interesses segundo o Feenberg podem ser denunciados e alterados para um modo de vida diferente e com um novo enfoque de eficiência.
Sua teoria sugere a democratização da administração, em todas as ordens da vida, e a supressão da diferença social entre o trabalho manual e intelectual.
Feenberg precebe em sua análise que a eficiência da tecnologia, não é descompromissadamente sua, mas sim uma eficiência construída por interesses sociais, pois como a tecnologia é patrocinada pela economia capitalista, caminha em um sentido de instrumentalização da vida.
O autor ainda afirma que nesse contexto o computador e a internet não são mecanismos de alienação mas de iniciativa, inteligência e comunicação.
No que diz respeito a iniciativa de Feenberg de um discurso Marxista, o autor mostra consciência de que assumir uma sociedade com as características do discurso socialista está longe de ser facilmente implementada, afirma ainda que sua implementação depende da colaboração das elites técnicas da sociedade, pois sua proposta reivindica uma democratização da administração, em todas as ordens da vida, a eliminação da diferença social  entre trabalho manual e intelectual.
A intenção da intervenção de Feenberg é a de quebrar a ilusão de necessidade de que o mundo quotidiano está recoberto.
Em comum ao discurso dos três autores temos a intenção da melhoria da vida no mundo por meio da utilização cooperativa e socialmente participativa das tecnologias.


terça-feira, 24 de maio de 2011

A perspectiva crítica de Abdrew Feenberg

Sintese do texto: A perspectiva crítica de Abdrew Feenberg

Alberto Cupani

Por Djalma Gonçalves Pereira

Como terceiro enfoque de nossa averiguação dos conceitos sobre a tecnologia, temos a abordagem de Feenberg, baseada prioritariamente em sua obra Transforming technology (2002), onde o autor interpreta a tecnologia de uma forma bem próxima a de Boergman, mas sugerindo razões diferentes para a crítica tecnológica.
Feenberg rejeita a visãos instrumentalista e substancialista defendida por Borgman e amplia o enfoque na análise da escola de Frankfurt que pretende reconstruir a ideia de socialismo com base numa radical filosofia da tecnologia.
Para Feenberg a tecnologia é um fenômeno tipicamente moderno, constituindo a estrutura material da era moderna, ela não é um mero meio instrumento e muito menos supõe a neutralidade, a tecnologia promove valores que são antidemocráticos e provem do envolvimento da tecnologia com o capitalismo, vindo de uma cultura de empresários que enxergam o mundo em termos de controle, eficiência e recursos.
Os valores destilados pelas classes dominantes são próprios dos procedimentos das máquinas e das decisões que as mantêm, mas isso não significa que a tecnologia constitui uma entidade autônoma ou um destino, pois as conquistas da natureza que a tecnologia se apropria não são eventos metafísicos, mas um processo de dominação social.
Em concordância com Heidegger, 1997 [1954], Feenberg afirma que o controle da natureza é indissociável do controle dos seres humanos, traduzindo fenômenos típicos da nossa época, tais como a degradação do trabalho, da educação e do meio ambiente. Tudo em favor de uma manifestação de racionalidade política onde a tecnologia não pode ser modificada mediante reformas morais ou atitudes espirituais, como apresentado por Borgmann.
Feenberg acredita que somente através de uma modificação cultural proveniente de avanços democráticos não deterministas seria possível alterarmos a situação de degradação vivida.
O desenvolvimento tecnológico baseia-se em critérios técnicos, sociais e de progresso que se dividem em várias direções, variando de acordo com a hegemonia que prevalecer. Provocando a adaptação do desenvolvimento tecnológico as instituições sociais que mudam em resposta às condições promovidas pelos avanços tecnológicos, ficando a sua mercê.
Para compreendermos os efeitos dessa modificação tecnológica, é prioritária a compreensão de que existe uma classe a qual comanda e outra que obedece, formando assim a civilização tecnológica, onde o poder por ela dado, tornou-se a principal forma de poder, substituindo as formas como o conhecimento e a religião.
O poder é uma forma de administração e controle das atividades sociais e pessoais. Os administradores, capitalistas e tecnocratas possuem a autonomia operacional, que lhes dá liberdade para tomar decisões independentes, desconsiderando interesses dos subordinados e da comunidade e principalmente, ignorando as consequências ambientais.
Essa autonomia operacional tem como objetivo a auto-preservação indefinida, que acaba sendo garantida pela racionalidade da tecnologia, amparada na necessidade da eficiência dos resultados.
As decisões tecnológicas em função da eficiência tornou-se o valor característico da dimensão tecnológica na vida humana, mas a eficiência por si só, não é suficiente para determinar o desenvolvimento tecnológico, pois ela mesma pode ser definida de diferentes maneiras, conforme os interesses sociais envolvidos.
Feenberg afirma que “Os objetos técnicos são também objetos sociais” e o desenvolvimento  tecnológico “é um cenário de luta social”. Onde compara o desenvolvimento tecnológico com o uso da linguagem, em que a gramática condiciona o significado, mas não decido o propósito, mas no caso da tecnologia, existe um código social que associa eficiência e propósito.
Feenberg ainda destaca que uma invenção é como uma linha de montagem, onde através de uma coerência técnica própria que não depende de política ou relações de classe, é desenvolvida e atinge sua forma eficiente e seu objetivo capitalista de lucro. Diferente da tecnologia, que não se reduz a estas relações simples de produção, e nem mesmo ao conhecimento técnico e a ideologias, mas sim a sua própria lógica, que para realmente funcionar precisa abranger um caráter social da tecnologia que não reside na lógica de seu funcionamento interno, mas na relação dessa lógica com um contexto social.
O código capitalista tem a eficiência como uma forma de chegar ao lucro, que se realiza por meio da venda das mercadorias, ignorando outras relações que possam estar associadas a seu produto, deixando de lado preocupações como qualidade de vida, educação, justiça social e a proteção ao meio ambiente, situações que são reduzidas a meras externalidades.
Essa eficiência poderia através de um outro código moral atender as exigências humanas tais como igualdade de oportunidades, proteção aos descapacitados, satisfação no trabalho, direito ao lazer, dentre outros aspectos que hoje são tratados como reivindicações econômicas  e morais, pois no entendimento de Feenberg, a eficiência não precisa abstrair tudo o quanto não se refira ao lucro, ao poder e ao consumo para atingir seu objetivo.
Para Feenberg, o capitalismo, bem como o socialismo burocrático, incentivam realizações tecnológicas que reforçam as estruturas hierárquicas e centralizadas com o controle atribuído de em todos os setores da vida humana, tais como o trabalho, a educação, a medicina, as leis, os esportes, os meios de comunicação, dentre outros. Ou seja, para Feenberg existe uma mediação técnica generalizada a serviço de interesses dos privilegiados que reduzem em todas as partes em nome da eficiência as possibilidades humanas, impondo em todo lugar, como medidas óbvias de disciplina a vigilância e a padronização.
É preciso destacar as realizações tecnológicas que são abstratas e descontextualizadas, pois são objetos e procedimentos que não pertencem a nenhum mundo cultural específico, e por isso acredita-se livre da responsabilidade de suas consequências em suas atividades, mas na verdade não passam de momentos típicos da reificação social que a tecnologia representa.
 No entanto Feenberg destaca que é precisamente a percepção dessas limitações e deformações que podem estimular movimentos políticos transformadores.
O autor tem a esperança de que através da hegemonia do código técnico do capitalismo, que não impede iniciativas contrárias, a sociedade que comparada a um jogo de estratégias de domínio, preserve a autonomia operacional e conteste a tática dos dominadores aproveitando a margem de manobra.
Táticas contestadoras são possíveis devido a evolução tecnológica não poder ser controlada em nenhuma instância, sendo assim, o resultado da contestação da mesma forma não pode ser previsto. Há o risco de a tática dos dominados ser absorvida pela lógica dos dominantes, tanto quanto pode se estabelecer e gerar novas relações.
A contestação do rumo autoritário da tecnologia não seria possível se ela não fosse ambivalente, podendo ser instrumentalizada em diferentes projetos políticos.
Feenberg afirma que “a tecnologia é em grande parte um produto cultural e, assim, toda ordem tecnológica é um ponto de partida potencial para desenvolvimentos divergentes, conforme o ambiente cultural que lhe dá forma”.
Perceber na tecnologia uma dupla instrumentalização, sendo uma a atitude ou orientação com relação a realização que é a instrumentalização primária e também, um modo de ação ou realização no mundo social que é a essência da tecnologia, promove a união dialética entre ambos os níveis de instrumentalização.
A mudança social sugerida, necessita de critérios de progresso que nos levem em direção a realização humana. Feenberg resgata com sua teoria a tradição humanista, entendendo que a sociedade progride na medida em que aumenta a capacidade das pessoas para assumir responsabilidade política, isso contra toda forma de discriminação, liberdade de pensamento, respeito a individualidade e se estímulo a criatividade.
Feenberg questiona, para que tipo de sociedade essa transformação nos levaria?
Levando em conta o fracasso dos sistemas comunistas pelo mundo, principalmente em relação a economia, bem como na promoção da democracia, o autor propõe uma nova noção de socialismo que tem como meta a transformação cultural. Retomando criticamente as idéias de Marx e da Escola de Frankfurt, propõe interpretar o socialismo não apenas como uma questão política, mas um episódio histórico de uma transição gradual que leve a civilização a um desenvolvimento de potencialidades humanas que hoje são negadas.
Esse socialismo significaria uma oposição imediata ao capitalismo, mas sim uma possível evolução a partir dos atuais estados de bem-estar social.
Feenberg cita como exemplos de ações deste socialismo medidas que poderiam pôr em movimento processos de extensão da propriedade pública, aprendizagem das necessidades imediatas da economia, e a transformação das técnicas e do treinamento profissional para incluir um leque cada vez maior de necessidades humanas no código técnico, sendo a adoção dessas medidas índice de avanço social para além do atual capitalismo.
Nessa proposta não está sendo esboçado um processo de implementação fácil, nem sequer provável. Por isso, Feenberg assume que “ Estas reflexões são estritamente condicionais. É impossível predizer o futuro, mas pode-se tratar de esboçar uma senda coerente de desenvolvimento que conduziria a um resultado propriamente socialista em circunstâncias favoráveis. A discussão está assim endereçada não à probabilidade de um tal resultado, mas à sua possibilidade. [...] estabelecer essa possibilidade não é apenas um ato de fé política; tem também uma função heurístia: é um modo de quebrar a ilusão de necessidades de que o mundo quotidiano está revestido. (Fennberg, 2002, p. 150)

domingo, 22 de maio de 2011

REFLEXÕES SOBRE A POLÍTICA DA INTERNET

Por Márcia Guimarães Oliveira de Souza

            O presente texto tem como base a leitura e análise do capítulo 5  do livro A galáxia da internet de autoria de Manuel Castells, 2001.
            Inicialmete falaremos sobre a abordagem que Castells faz  acerca da utilização que os movimentos sociais e os agentes políticos fazem da Internet e do ciberespaço que converteu-se numa espécie da praça pública eletrônica e global. Mais do que uma tecnologia, a Internet é hoje um meio de comunicação e constitui a infraestrutura material de uma forma organizativa concreta, ou seja, a rede.
            Movimentos sociais de todo o mundo, ao longo da década de 90 puderam se organizar graças à ajuda da Internet. Por outro lado, a Internet permitiu e ainda permite expressões de protesto, sejam eles individuais ou coletivos de hacker-activistas que acessam informações tanto a nível individual como também em websites restritos de agências militares, companhias financeiras, entre outros, tanto para demonstrar a insegurança dos sistemas, quanto para manifestações de protesto contra objetivos que ai são defendidos.
            Os movimentos culturais que tem como objetivo defender ou propor modos próprios de vida e de sentido, constroem-se em torno de sistemas de comunicação, ou seja, essencialmente a Internet.
            Os movimentos sociais procuram também preencher o vazio deixado pelos partidos políticos que surgiram na hera industrial e que hoje não passam de maquinaria eleitoral, como também as associações de cidadãos formais que encontram-se em franca decadência.
            Observa-se também um tipo de manifestação provocada por movimentos emocionais, provocados por uma grande crise, que tornam-se fontes de mudança social mais importantes que a rotina de ONGs responsáveis. "Conseguem um impacto publicitário nos meios de comunicação e agem sobre as instituições e as organizações (as empresas, por exemplo), graças às repercussões do seu impacto na opinião  pública."(p.171). Convergem temporariamente para um determinado protesto simbólico, provocam debates, sem, contudo, entrar em negociação, pois não há ninguém capacitado para atuar em nome de tais movimentos, para logo depois se dispersarem, se dissolverem para  se concentrarem em seus próprios assuntos.
Os processos de mudança conflituosa na era da Internet giram em tono dos esforços para transformar as categorias de nossa existência, construindo redes interativas como formas de organização e mobilização. Estas redes que surgem como resistência de  sociedades locais, propõem-se a vencer o poder das redes globais para assim reconstruir o mundo a partir de baixo.(p.173)
            É dessa forma que a Internet se estabelece como uma alavanca de transformação social.
            O grande movimento de ligação à rede Internet de comunidades em todo o mundo, ocorreu de meados dos 80 até o final dos anos 90. Foram levados à rede centenas de cidadãos que até então permaneciam no anonimato, levando experiências, interesses, preocupações a serem compartilhadas.
Portanto, assim que word wide web se difundiu à escala global, e o acesso à Internet começou a ser relativamente acessível e fácil de manejar, as redes informáticas comunitárias começaram a diferenciar-se internamente segundo a ideologia dos seus membros originais.(p.176)
            Esse movimento impulsionou o terceiro setor da economia que passou a auxiliar tanto na educação como no trabalho das pessoas necessitadas.
A EXPERIÊNCIA DE AMSTERDAN
            Castells descreve a experiência de Amsterdan, a mais famosa das redes de informáticas de didadania. Conhecida como “De Digitale Stad”  DDS, a Cidade Digital iniciou em janeiro de 1994. Experiência pioneira desenvolvida na Holanda, mais precisamente na cidade de Amsterdan, foi planejada para um funcionar num período de dez semanas, com o objetivo de estabelecer um diálogo entre os cidadãos da cidade de Amsterdan, uma experiência social de comunicação interativa. Foi reconhecida como o movimento inaugural da “cultura digital pública”, uma esfera que combinou instituições locais, organizações populares e redes de computadores no desenvolvimento da expressão cultural e da participação cívica.
            Em virtude do seu grande sucesso, foi expandida para um “comunidade em rede”. Os seus utilizadores convertiam-se em "residentes"da cidade ou " visitantes", possibilitando, assim, um acesso global. "Organizada virtualmente em vivendas, praças, cafés , quiosques digitais, centro digital de arte e cultura e mesmo uma sex-shop digital."(p.177)
            A estrutura da cidade era baseada em um site, que possuía um quadro de avisos para que os cidadãos tivessem acesso a documentos de interesse, notificações de decisões do conselho municipal consideradas relevantes, além de um espaço para que os interessados expressassem a sua opinião sobre assuntos diversos.
            O interesse das pessoas na cidade digital tomou tamanha proporção que  um ano após seu início, tinha 4000 usuários, com uma solicitação mensal de um milhão de páginas da web; em três anos, este número subiu para 50.000 e no ano 2000 já era de 140.000, tornando-se a maior rede de computadores baseada numa comunidade na Europa.
A importância dessa experiência se deve tanto pela análise das origens das redes de cidadania, quanto pelo seu desenvolvimento posterior.
INTERNET: INSTRUMENTO POLÍTICO DEMOCRÁTICO?
            Não podemos afirmar  que a Internet um dia será instrumento de fomento da democracia, mas sim, que hoje ela ainda não é.  Em um regime democrático em que teoricamente, o poder reside no povo, pensamos que as pessoas poderiam vigiar os seus governantes, e não contrário. Não estamos nos referindo a mecanismos de controle da política, mas sim, da Internet como espaço político.
            A Internet vem sendo utilizada como quadro de publicidade eletrônica, divulgando informações, sem o objetivo de interação com a população.
Para Castells, os cidadãos sentem que não faz muito sentido gastarem suas energias em discussões políticas, exceto quando se vêem afetados por um determinado acontecimento que desperta a sua indignação ou afeta seus interesses pessoais. (p.188)

            Observamos, entretanto, que a Internet não cumpre o seu papel democrático de ambos os lados da sociedade, ou seja, governo e governados, no entanto, cumpre o papel de política informacional.
            A Internet sendo usada como canal de um para muitos, sua utilização por parte de jornalistas independentes, ativistas políticos e pessoas de uma maneira geral, está crescendo a cada dia. O maior problema está na credibilidade, na veracidade das informações que circulam. De qualquer forma, o uso da informação passa a ser ferramenta privilegiada na era da Internet, ampliando a política do escândalo, podendo derrubar um político em qualquer parte do mundo, da mais alta hierarquia, do dia para a noite.
            Considerando que a guerra é a prática da política por diferentes meios,  podemos dizer que a política informacional possibilitou a guerra informacional, gerando uma nova doutrina de segurança apropriada para era da Internet.
            Atualmente, quanto mais dependente for um governo de uma rede avançada de comunicações, mais vulnerável a ataques hackers ele estará.
            Observamos que a dimensão política das nossas vidas está a ser profundamente transformada com a co-evolução paralela da Internet e da sociedade. A liberdade, sabemos que é conquistada.  A Internet permite o direito de expressão e comunicação das pessoas de todos os níveis e por isso mesmo, torna-se um dos principais e mais importantes desafios políticos.
BIBLIOGRAFIA
CASTELLS, Manuel. Galáxia da Internet: reflexões sobre a internet, negócios e sociedade. Tradução de Maria Luíza X. de Borges, A. Rio de Janeiro: Zahar, 2003.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

A Galáxia Internet: Reflexões sobre Internet, Negócios e Sociedade

Capítulo do livro “A Galáxia Internet: Reflexões sobre Internet, Negócios e Sociedade".
Autor: Manuel  Castells


Multimédia e Internet:
O hipertexto para lá da convergência
A alusiva caixa mágica


 Por Betânia Magela Pereira Silvoni                       

Na década de 90, futurólogos, tecnólogos e magnata mediáticos, perseguiam o sonho da convergência entre computadores, Internet e media. A palavra-chave era multimédia, materializada na caixa mágica que colocaríamos na sala de estar de nossa casa e que, seguindo as nossas instruções, nos abriria uma janela global para infinitas possibilidades de comunicação interativa em formato de vídeo, áudio e texto. Entre 1998 e 2000,  a Microsoft  fez um investimento dez milhões de dólares em empresas de cabo por todo o mundo assentando as bases para o controle do mercado da nova tecnologia de software encarnada no futuro descodificador interativo de televisão..  Este sonho foi adiado, pois   não consegui entregar  o software no tempo previsto. 12 de janeiro de 2001, a autoridade reguladora dos EUA, a FCC- Federal Communications Commission, aprovou a fusão da AOL e Time Warner, avaliada em 100 milhões de dólares, considerada como a base empresarial para que se cumprisse a promessa multimédia. Ainda assim, as provas comerciais da convergência de meios levadas a cabo desde o começo dos nos 90 acabaram em intenções falhadas, principalmente no aspecto tecnológico que respeita ao vídeo. Owen, em sua análise comentada sobre o tema, enumera:
  • A emissão de sinais de televisão através da  Internet, não era possível com a largura de banda e a tecnologia de compressão disponíveis no ano 2000, mas será tecnologicamente possível na primeira década do século XXI.
  • A transmissão por Internet e a inclusão em páginas Web de informação de vídeo é já uma prática habitual.
  • A televisão pode utilizar-se como terminal e ligar-se à Internet através de um computador e de uma linha telefônica( o conceito de WebTV).
  • O intervalo entre sinais de vídeo emitidos(por ondas ou por  cabo) pode utilizar-se para  transmitir informação aos computadores pessoais, incluindo acesso à Internet(por exemplo, o Intercast da Intel).
  • É possível transmitir páginas Web através de linhas telefônicas a um ecrã de televisão para proporcionar informação complementar(por exemplo, Gateway 2000 ou Net TV).
  • A informação transmitida através da Internet pode coordenar-se com a emissão convencional de televisão através de servidores suportados por emissoras de televisão, com visualização em diferentes monitores.
  • A comunicação por cabo ou sem fios pode utilizar-se para transmitir conteúdos de Internet a computadores. A Microsoft, em colaboração com a ATT, apostou numa grande companhia de cabo, a MSO, que utiliza ligações de modem cabo e descodificadores que funcionam com o software da Microsoft.
  • Pode transmitir-se pela Internet material não videográfico de banda estreita, possibilitando a disponibilização de ícones de animação nas páginas web, tais como o software Dynamic HTML.
  • Os canais de televisão podem utilizar-se, quando não estão a emitir, para transmitir informação, vídeo incluído, a dispositivos de armazenamento aos quais se pode aceder a partir de um computador.
Owen, recorda-nos  que atualmente  todas estas alternativas citadas, exceto a primeira, estão em fase de experimentação.
Para Bob Pittman, diretor operacional da AOL- Time Warner, o mundo dos media está a atravessar uma extraordinária transformação, tornando-se global e encontrando economias de escala  e sinergias entre os diferentes modos de expressão. A emissão pos satélite e a televisão digital estão em franca expansão por todo o mundo, especialmente na Europa. Constata-se que  nos Estados Unidos entre 1985 e 2000, os jovens norte-americanos, menores de 18 anos reduziram em 20% o número de horas em frente ao televisor. Esta mudança atribui-se em parte ao fato de os jovens passarem cada vez mais tempo  a navegar na Internet e o  setor de cabo está investindo somas inéditas para conseguir difundir todo o tipo de conteúdos para qualquer lugar.
A rádio está vivendo uma era do renascimento e está transformando no meio de comunicação mais difundido do mundo. E o mundo da edição de livros continua também em expansão.
O nível de convergência entre a Internet e os multimédia é muito limitado e portanto, não há nenhuma interatividade, que é o fator-chave da projeção autêntica do futuro multimédia. E a que se deve isto? A largura de banda insuficiente. No ano 2000, menos de um quinto dos lares norte-americanos tinha acesso à transmissão DSL,- digital subscriber line.  A largura da banda que era disponível a eles era muito pequena em relação aos habitantes que tinham acesso. Par que este quadro mudasse, era necessário um investimento extraordinário de milhões de dólares por parte das companhias multimédia e de comunicação. As experiências desenvolvidas em meados  dos anos 90 demonstraram que os consumidores não estavam dispostos a pagar mais dinheiro para aumentar a sua seleção de vídeo dentro do mesmo gênero. O erro que cometeu o setor mediático foi pensar que a procura  de entretenimento era ilimitada, e que isto era a única coisa  que interessava aos consumidores, excluindo uma elite cultural cujos gostos se podia satisfazer com revistas de alto nível, exposições de arte subsidiadas e espetáculos de alta cultura.
A  AOL comprou a Time Warner.Na data em que por fim se conseguiu aprovar a fusão, os acionistas da Time Warner perderam valor em bolsa, A jogada estratégica foi cara, já que a AOL  sofreu perdas superiores  de milhões de dólares em 2000.
Talvez os visionários tecnológicos tenham razão e simplesmente tenham calculado mal o horizonte temporal das suas previsões. Afinal de contas, pode bem ser que a banda larga acabe por se implantar em todos os âmbitos da vida privada, que a tecnologia de compressão resolva alguns dos problemas de  transmissão  e que as pessoas  acabem percebendo  as maravilhosas oportunidades que oferece o nosso ambiente digital.
Para  o autor, a única maneira de entender a relação potencial entre a Internet e o mundo dos media é refletir sobre os únicos casos em que a sua integração funcionou nos finais do século XX.  


segunda-feira, 16 de maio de 2011

A abordagem fenomenológica de Albert Borgmann

Segue mais um capítulo do texto sintetizado do texto de Alberto Cupani, este particulamente, eu gostei bem mais que o anterior, sua abordagem fenomenológica da tecnologia trás a tona dúvidas pertinentes em nossa relação com as tecnologias.
Vamos lá, parcipe!

A abordagem fenomenológica de Albert Borgmann

Alberto Cupani

Síntese por Djalma Gonçalves Pereira

Ao contrário de Bunge que acredita na tecnologia como uma forma técnica mais evoluída e potente graças a sua associação com a ciência, Borgmann que como veremos aqui, compreende a tecnologia como um modo tipicamente moderno de o homem lidar com o mundo, chegando a ser um padrão característico e limitador da existência humana que tornou-se intrínseco a vida cotidiana, a ponto de não percebermos.
Para Borgmann “o evento de maiores consequências do período moderno” é a tecnologia, por isso em sua obra ele propõe um estudo fenomenológico da mesma, a fim soluções para o problema que a tecnologia apresenta.
Borgmann justifica o caráter fenomenológico para sua pesquisa devido acreditar que só ela possui características que não deixam escapar nenhum dos aspectos da tecnologia, bem como suas especificidades.
O enfoque fenomenológico foi escolhido por Borgmann devido a sua percepção de que outros enfoques perdem de vista ou mesmo não reconhecem especificidades tecnológicas. As teorias que vêem a tecnologia como meio a serviço do homem, as instrumentais, são superficiais e as teorias que acreditam que a tecnologia seja autônoma, as substancialistas, deixam por explicar qual é o caráter da tecnologia. Sem contar as teorias pluralistas que insistem na multiplicidade de fatores a que responde a tecnologia, porém, isso a faz perder de foco o esquema básico que dá sentido ao conjunto. As ciências sociais são inconclusivas, pois as complexidades dos fenômenos sociais as quais a tecnologia está inserida tornam sua interpretação ambígua.
Borgmann acredita que a tecnologia e os seus problemas não serão compreendidos enquanto considerarmos estes, conseqüências de fatores sociais, políticos ou ecológicos. É preciso reconhecer na tecnologia um fenômeno básico, que tem sua formação na existência de dispositivos que nos fornecem produtos, ou seja, bens e serviços, seja ele um aquecedor elétrico, um automóvel ou uma televisão. Para isso devemos destacar que a noção de dispositivo difere da noção de coisa, sendo ambos paradigmas de duas formas diferentes da vida humana, sendo este o caminho de contraste através do qual Borgmann pretende mostrar a verdadeira identidade e a índole da tecnologia.
Dispositivos são essencialmente um meio, por isso se faz necessário distinguir a maquinaria do dispositivo e sua função. Sendo a função conhecida do usuário, a maquinaria é geralmente incompreendida e até mesmo incompreensível para o usuário. É a ignorância da máquina, como acontece, por exemplo, com o computador, pois, ainda que saibamos operá-lo bem (função), aliviando esforços, libertando de pesos ou resolvendo dificuldades, não compreendemos o funcionamento de sua maquinaria.
Diferentes dispositivos podem nos oferecer o mesmo produto, pois dispositivos tem equivalentes funcionais, estes tem por característica tornar disponível o produto correspondente, essa disponibilidade significa que os produtos podem ser consumidos de maneira instantânea, segura e fácil. Como exemplo temos o alívio de satisfação ao acender a luz, ouvir música, encontrar uma informação, todas possíveis apenas apertando um botão de um aparelho que encontra-se sempre a mão.
A disponibilidade possui ainda outras características, das quais podemos verificar na citação de Bergmann que se segue:
Uma forma de tornar disponível os produtos é torná-lo descartáveis. Não é apenas desnecessário, mas impossível manter e reparar guardanapos de papel, latas de conserva, canetas esferográficas ou qualquer outro produto destinado a ser usado uma vez. Outro modo da disponibilidade é tornar desnecessário o cuidado dos produtos. Os talheres de aço inoxidável não requerem polimento, os pratos de plástico não precisam ser manipulados com cuidado. Em outros casos, a manutenção e a reparação tornam-se impossíveis por causa da sofisticação do produto [...] os microcomputadores estão sendo usados cada vez mais porque vão se tornando “amigáveis”, isto é, fáceis de operar e compreender. Mas esse caráter “amigável” é precisamente o sinal do quanto se tem tornado grande o hiato entre a função acessível a todos e a maquinaria conhecida por quase ninguém... (Borgmann, 1984, p.47).
Os produtos e seu consumo constituem “a meta declarada do empreendimento tecnológico”, meta essa proposta no início da Modernidade, com a expectativa que o homem pudesse dominar a natureza. Essa expectativa convertida em programa anunciado por Descartes e Bacon, impulsionado pelo Iluminismo, não surgiu de um prazer de “poder” de mero imperialismo humano, mas da aspiração de libertar o homem da fome, da insegurança, da dor e da labuta, para enriquecer sua vida física e culturalmente. Esse ideal de liberdade foi quem moldou a sociedade nos países industrialmente desenvolvidos, não bastando portanto entender a tecnologia somente pelo aspecto de natureza dominada, associação econômica com a ciência. O avanço científico foi imprescindível para o surgimento das invenções tecnológicas, mas a ciência por si só, não pode fornecer um rumo nem explicar a tecnologia sendo incorporada como um modo de vida pela população.
Esse modo de vida implica em uma tendência de reduzir todo e qualquer problema a uma questão de relação entre meios e fins. O mundo dos dispositivos é um mundo de meros meios, sem fins últimos, que por si define a diferença entre técnica e tradicional e a tecnologia, pois na técnica toda relação meio-fim estava inserida em um contexto social, cultural ou ecológico, já na tecnologia a relação meio-fim vale universalmente independente dos contextos concretos. Vejamos, enquanto a lareira tradicional é um meio para aquecer o lar, promovendo relações entre os membros da família, pois seu uso depende do trabalho, além de incentivar a reunião da família e o cultivo dos costumes, o aquecedor moderno se reduz a sua função de fornecer calor.
Os dispositivos carecem de contexto, usados para diversos fins e combinados entre si sem restrições. Eles são assim ambíguos, sendo assim, nossa relação para come eles é de falta de compromisso, de envolvimento.
Borgmann comenta que em nenhum aspecto de nossa vida essa relação fica tão evidente quanto na propaganda, pois o apelo constante e sistemático ao consumo de dispositivos aparecem nas combinações mais insólitas, como carros associados a obras de arte, símbolos religiosos misturados a figuras sensuais, etc, acentuando a superficialidade dos dispositivos.
Para Borgmann a propaganda não cria a cultura de consumidores, mas a regula e a põe de relevo.
[...] o universo da propaganda é inteiramente um universo de produtos e consumo. Ela destila o aspecto frontal da tecnologia em forma ideal e assim apresenta o lado técnico e distintivo da nossa época. Deste modo, ela superou a arte como a apresentação arquetípica daquilo de que trata a nossa época. Na propaganda, a promessa da tecnologia é apresentada ao mesmo tempo em pureza e concretamente, e, portanto, da maneira mais atraente. Problemas e ameaças entram apenas como pano de fundo para descartar as benções da tecnologia. Assim, nos encontramos definidos arquetipicamente nas propagandas. Elas fornecem uma força estabilizadora e orientadora na complexidade da sociedade tecnológica ainda em desenvolvimento (Borgmann, 1984, p.55).
O consumo universal de produtos é a realização da promessa tecnológica. É o sonho de uma vida humana menos penosa e mais rica, que tem se transformado em uma cultura que visa apenas o lazer derivado de consumir cada vez mais produtos tecnológicos. É a vida dentro do paradigma da tecnologia, sem rumo e impositiva.
São exemplos de práticas focais, tocar um instrumento em companhia de outras pessoas, caminhar na natureza ou comer em família, todas dirigem a nossa atenção a coisas como mesa familiar, instrumento musical, natureza, em que não são meros meios para determinados fins, são fins em si mesmos. Não se tratam de elementos que podem ser colocados a serviço de qualquer propósito, pois reservam propósito próprio. São coisas com as quais nos comprometemos e que nos remetem a um contexto social, cultural e ecológico. São coisas profundas, coisas que reconhecemos e respeitamos em seu próprio direito.
Mas certamente é possível tratar algumas dessas coisas como meros meios:
Quando olhamos tecnologicamente para uma lareira pré-tecnológica, separamos da plenitude dos seus traços a função de fornecer calor como a única e finalmente significativa. Todos os outros traços são considerados então com parte da maquinaria e, estando sujeitos à lei da eficiência, tornam-se dependentes e indefinidamente mutáveis. A visão tecnológica de uma comida revela um agregado de sabores, texturas e características nutritivas. Só elas retêm significação estável [...] Analogamente, quando olhamos para uma árvore vemos certa quantidade de madeira ou fibra de celulose; os espinhos, os ramos, a cortiça e as raízes são resíduos. Uma rocha é 5 por cento de metal e o resto é lixo. Um animal é visto como uma máquina que produz tanto de carne. Qualquer uma das funções que não serve para esse propósito é indiferente ou incômoda (Borgmann, 1984, p.192).
E nisso consiste a atitude tecnológica, o universo humano perde coisas e práticas focais para passar a ser constituído apenas por dispositivos que se produzem, usam ou se consomem. É um mundo onde não só objetos naturais ou artificiais perdem seu foco, mas também os objetos sociais e culturais, como governo e educação, que são levados em consideração apenas como meios para fins circunstanciais.
Esse universo está dividido entre o labor e o lazer, em uma divisão que se espelha a que existe entre a função e a maquinaria do artifício.
A diferença do trabalho tradicional inserido em uma rede social e cultural que dava sentido a vida do homem, orientando-o na natureza, cultura e sociedade, está no labor tecnológico que se reduz a produção e manutenção das maquinarias que fornecem os artifícios, ou então, à produção de artifícios como meios de lazer, sendo esse último a diferença entre o prazer que eleva e refina, enobrecendo a vida humana, reduzindo a vida ao consumo indefinido de produtos tecnológicos, dissociado de qualquer preocupação com a excelência da vida pessoal.
A vida dentro do paradigma tecnológico tem um glamour que explica em parte a sua propagação. A tecnologia, como já foi lembrado, promete-nos alívio de tarefas penosas, com uma relação mais rica com o mundo graças a influencia de dispositivos que respondem a nossa impaciência com coisas que exigem cuidado e reparação, bem como ao nosso desejo de fornecer a nossos filhos o melhor desenvolvimento, e a vontade de nos afirmarmos na existência adquirindo bens que inspiram respeito. Mas tudo isso vai acompanhado de sentimento de perda, de pena e uma espécie de traição a outro tipo de vida, pois as realizações que representavam libertação “parecem ser contínuas com a procura de frívola comodidade”. Dá-se inclusive uma sensação de impotência, pois tudo ocorre como se os instrumentos tivessem acabado por definir os fins.
A sensação de estar sutilmente preso ao mundo tecnológico ainda que não pareça mais possível viver sem esses produtos, Borgmann acredita que o homem seja simplesmente arrastado pela tecnologia. Borgmann acredita que temos responsabilidade pela manutenção do modo de vida tecnológico que nos fascina em função do glamour já mencionado aqui antes.
As circunstancias sociais favorecem a manutenção e o progresso da tecnologia como paradigma. A desigualdade social favorece que cada um aspire ter o que o outro já têm. Nem a riqueza da ao homem poder sobre a tecnologia, pois esta constitui uma cultura, um horizonte em função do qual são tomadas todas as decisões, os mais bem providos estão tão sujeitos a seu padrão quanto os mais pobres. Mas nada disso implica para Borgmann, a crença de que a tecnologia constitua uma fatalidade.
As tentativas de diagnosticar e corrigir o rumo da sociedade tecnológica sofrem do defeito de pressupor aquilo que querem emendar. A promessa tecnológica está em harmonia com os ideais de liberdade, igualdade e auto-realização que são próprios da democracia liberal a qual foi constituída de acordo com o paradigma tecnológico.
As políticas filosóficas sobre a sociedade justa, ao deixarem de lado a questão da “vida boa” para limitarem-se a fundamentar a justiça, subestimam a singularidade da relação meios-fins no paradigma tecnológico e ignoram o quanto dependem dele (cf. Borgmann, 1984, p.95 e ss.).
Uma reforma que parta do reconhecimento do paradigma da tecnologia e da importância daquilo que ele vai nos fazendo perder: coisas práticas focais. A argumentação em favor de uma tal reforma não pode ser demonstrativa, à maneira das ciências, nem tão pouco paradigmática, como o foi a descrição do paradigma tecnológico, mas dêitica ou mostrativa, baseada naquelas experiências de coisas que possuem valor e direito de existir em si mesmas e não como meros meios, e no testemunho delas. A explicação dêitica não é concludente, mas apelativa, e pode ser sempre contestada (cf. Borgmann, 1984, cap.21).
Cupani acredita que Borgmann pretende com suas palavras despertar no leitor a experiência, a lembrança e o desejo daquelas coisas e práticas que podem centrar e orientar a vida humana, convencendo-se assim da necessidade e possibilidade de se contrapor à tendência do universo tecnológico.
A reforma proposta apela expressamente para restabelecer a importância da questão da vida boa, aparentemente eliminada na tecnologia, ou melhor, resolvida a seu modo, e encontrada pelas teorias éticas liberais.
Finalmente pode-se afirmar que para Borgmann é possível sim conceber uma utilização da tecnologia e dos seus aperfeiçoamentos, na medida em que permita e favoreça qualquer prática focal que tenhamos escolhido. Vista assim, a tecnologia realça o caráter de tais práticas, em vez de soterrá-las, como acontece quando se vive em cumplicidade com ela.

Vamos refletir?
Tente responder as seguintes questões:
1 – Como ficou para você a noção de “dispositivo” e “função”?
2 – Na afirmação de Borgmann que diz: “...a ciência por si mesma, não pode fornecer-lhe um rumo nem explicar por que a tecnologia tem chegado a ser um modo de vida”. Você concorda com o autor quando faz essa afirmação?
3 – Como você compreende a noção de “vida boa” descrita por Borgmann?
Vamos lá!
Participe conosco desse colóquio virtual.

sábado, 14 de maio de 2011

A perspectiva analítica de Mário Bunge

Pesoal, eis mais um trecho da síntese do texto de Cupani. Leiam com atenção e nos ajudem participando inserirndo seu comentário sobre o texto e a pergunta apresentadas aqui.
Desde já agradecemos sua participação!

Alberto Cupani
Síntese por Djalma Gonçalves Pereira

A perspectiva analítica de Mário Bunge
Bunge apóia-se no historiador Lewis Mumford para definir técnica como o controle ou transformação da natureza pelo homem, o qual faz uso de conhecimentos pré-científicos, sendo assim a tecnologia consiste na técnica de base científica.
Seja técnica ou tecnologia, essa atividade exercida pelo homem produz um “artefato”, que na visão de Bunge, não precisa ser um coisa palpável como uma bicicleta ou remédio, pode ser simplesmente uma modificação de estado de um sistema natural como por exemplo, um rio desviado de seu curso natural, ou ainda a transformação de um sistema como por exemplo, ensinar uma pessoa a ler.
Nos casos citados Bunge acredita que uma forma de trabalho classificada como técnica , opera utilizando de recursos naturais como o cérebro ou troncos de árvores para ao transformá-los produzir novos produtos e resultados diferentes em sistemas conhecidos.
Para Bunge, algo artificial é “toda coisa, estado ou processo controlado ou feito deliberadamente com ajuda de algum conhecimento aprendido, e utilizável por outros” (Bunge, 1985a, p.33-4).
Podemos ainda encontrar outra definição de Bunge que diz: “Um sistema concreto ou material é um artefato se, e somente se, cada um dos seus estados depende de estados prévios ou concomitantes de algum ser racional” (Bunge, 1985b, p.223).
Sendo assim, podemos tomar “artefato” como qualquer interferência do homem que altere o estado de um sistema como, por exemplo, a cura de um paciente, a formação de uma equipe de trabalho, ou mesmo, a construção de armas atômicas, por isso, não é possível mensurar se um artefato é bom ou ruim.
Com a noção de artefato conhecida, agora partiremos para outra noção que caracteriza a técnica e a tecnologia, ela é a característica da planificação, onde tendo um objetivo conhecido, ou seja, o artefato é concebido primeiro como ideia, procura-se sistematizar por meio de conhecimentos já disponíveis, meios de produzir o objetivo primeiro, o artefato.
Neste processo a técnica recorre ao saber vulgar, esvaziado de saber científico. Enquanto a tecnologia serve-se do saber científico, como dados, leis e teorias.
Nas produções técnicas ou tecnológicas os elementos são vistos como recursos, sendo valorizadas genericamente do ponto de vista de utilidade para se adequar a cada necessidade do processo de construção do artefato.
Normas estáveis de comportamento são geradas com o uso das técnicas e tecnologias, pois ambas fazem uso de regras, instruções em um determinado número finito de ações em uma ordem pré-determinada, sendo que sem elas, nenhum artefato funcionaria ou seria passível de utilização por outros, como é estabelecido para os artefatos.
Outro motivo do uso de regras para as ações técnicas e tecnológicas são relacionadas a necessidade de sua eficiência e economia que lhe é característica.
Essas ações são essencialmente racionais, orientadas para garantir o sucesso do processo.
Podemos observar por um prisma que nos apresente a evolução humana embasada e propulsionada pelo desenvolvimento da técnica ao longo da história, tornando-se a técnica condição primeira para o processo evolutivo da raça humana. Nesse contexto a tecnologia vem como resultado da aceleração desse processo evolutivo provocado pela técnica.
A tecnologia se faz existir a partir do momento em que o homem questiona a fundamentação teórica da técnica aplicada, na busca do conhecimento científico à solução de problemas práticos.
Isso nos leva a definir que a tecnologia é o estudo científico do artificial.
Para Bunge não há tecnologia em artefatos onde o homem não se questiona em sua base teórica ou busca seu aperfeiçoamento, visto que a tecnologia se caracteriza como campo de conhecimento quando obedece a essa estrapolação do conhecimento.
Ao desenvolver um projeto tem-se ai a representação antecipada de um artefato, em uma apresentação que presume algum conhecimento científico, mas não podemos perder de vista que o propósito do projeto é criar um sistema funcional que desempenhe efetiva e eficientemente funções úteis determinadas pelo homem.
Podemos citar como exemplo de sistemas desse tipo artefatos tais como máquinas, que são sistemas não viventes projetados para auxiliar em algum tipo de trabalho.
A planificação dos dados ou projeto é a definição das rotinas e sub-rotinas necessárias para se alcançar o objetivo proposto, alterando o estado do sistema até o ponto desejado.
Nesse sentido a planificação tecnológica repousa no conhecimento científico, tratando de leis ou fragmentos de teorias que são traduzidas em enunciados nomo-pragmáticos, fundamentando regras práticas.
Vamos entender com um exemplo.
A lei da física, que é um enunciado nomológico, afirma que a água ferve a uma temperatura de 100°C, isto fundamenta outras regras tecnológicas, tais como, para ferver a água, aqueça-a a temperatura de 100°C, ou, para evitar que a água ferva, mantenha sua temperatura abaixo de 100°C.
Para Bunge, a tecnologia não pode ser simplificada a utilização de conhecimento científico, mas deve instigar a busca pelo conhecimento específico, dando origem à novas teorias tecnológicas. Estas podem ser caracterizadas em dois tipos, são elas: substantivas, que é aquela que provê conhecimento sobre os objetos da ação, que pode ser exemplificada, por exemplo, em uma teoria sobre o vôo, ou ainda, operativas, que são as que discursam sobre as ações de que depende o funcionamento dos artefatos, como uma decisão que otimize o trânsito aéreo de uma região.
Sendo assim, nas teorias substantivas, são aplicadas teorias científicas em situações reais.
As teorias operativas são mais diretamente tecnológicas, pois está presente desde o início da ação prevista, como por exemplo, na operação de uma máquina pelo homem.
Nos caos exemplificados o homem pode unir a tecnologia a conhecimentos ordinários, elementos da ciência formal e certos conhecimentos especializados não científicos, como quando pilota um avião, por exemplo, o conhecimento especializado não científico está presente, por exemplo, na teoria da decisão, denominada assim por Bunge.
Devemos destacar que essa separação entre as tecnologias não se torna um problema, pois as tecnologias são predominantemente substantivas ou operativas, dependendo do caso de sua aplicação.
“A tecnologia pode ser vista como a concretização da ação plenamente racional” (cf. Bunge, 1969, p.684;1985b, p.239)
Bunge defende ainda que quanto mais racionais forem o pensamento e as ações humanas , melhor poderá ser, em principio sua vida. Bunge confia que todos os problemas práticos humanos podem ser formulados tecnologicamente resolvidos, obtendo assim uma solução adequada que fundamente na ciência e na tecnologia esse sentido otimista bungeano que chega a ser uma possível engenharia social aplicada.
A engenharia social para ser efetiva deveria ser sistêmica e não fragmentária, produzida por equipes interdisciplinares e discutida democraticamente.
Bunge afirma que o desenvolvimento tecnológico tem causado inúmeros males e problemas, posto que até as invenções vistas como positivas comportam circunstancialmente conseqüências negativas.
Bunge rejeita a idéia de que a tecnologia é autônoma, pois depende de seres humanos para operá-la, controlá-la e viabilizá-la, a tecnologia fica assim sujeita a interesses e propósitos.
Muitos dos excessos e extravios tecnológicos são para Bunge, derivados do código moral implícito no uso da tecnologia. Esse código separa o homem do resto da natureza, autorizando-a a submetê-la e isentando o mesmo homem “superior” de suas responsabilidades.
Para combater essa situação Bunge defende uma ética que aponte as responsabilidades naturais da inovação tecnológica, mas que tudo, Bunge defende uma democracia integral, participativa e cooperativa, chamada de “holotecnodemocracia”, situada em um desenvolvimento tecnológico verdadeiramemte a serviço de todos.


Nossos questionamentos:
1 - A pesrpectiva analítica de Bunge é aceitável a luz das tecnologias encontradas nos dias de hoje?
2 - É utópia a holotecnodemocracia?
3 - Na perspectiva analítica o artefato, as teorias substantivas e operativas são pontos chave para compreensão de suas ideias? Se sim, defina o motivo.
4 - Você aceita a ideia de Bunge de que esta perspectiva é um tipo de engenharia social? Se sim, explique.


Obrigado por participar conosco de nosso crescimento!

sexta-feira, 13 de maio de 2011

A tecnologia como problema filosófico: três enfoques

Alberto Cupani

Síntese por Djalma Gonçalves Pereira

O estudo filosófico da tecnologia é recente, visto o tempo já existente das outras disciplinas filosóficas, dentre elas a filosofia da ciência.
A filosofia da tecnologia é um campo heterogêneo e talvez por isso ela nos ajude a reconhecer a tecnologia como parte da vida humana, não apenas como um evento histórico.
Não está definido de forma unânime o objeto da filosofia da tecnologia, existem várias relações da tecnologia contemporânea com as técnicas de épocas e culturas passadas já conhecidas.
Para distinguir observa-se a presença da ciência experimental na tecnologia.
Alguns estudiosos entendem a tecnologia como ciência aplicada, outros como uma continuidade de propósitos entre a técnica e a tecnologia. Talvez por isso, diferentes estilos de pensamento envolvem a reflexão filosófica tecnológica.
Existe apenas um um aspecto unânime, que é o da dimensão humana que marca a sociedade contemporânea no que diz respeito às suas motivações, desenvolvimento, alcance e conseqüências.
A compreensão da dimensão citada no parágrafo anterior reflete que a técnica é a capacidade humana de modificar deliberadamente materiais, objetos e eventos, que tem com sigo a chance de produzir novos elementos ainda não existentes na natureza, tornando o homem um pensador, produtor e idealizador.
Saber fazer, diferente de outras capacidades humanas como a capacidade de contemplar a realidade, de agir, de experimentar sentimentos e de se expressar mediante uma linguagem particular, articulada e enunciativa.
Esse aspecto nos leva a considerar e entender a tecnologia como modo de vida, principalmente quando esse modo de vida afeta ou influencia outros modos em que prevalecem as capacidades humanas que já enumeramos aqui anteriormente.
Vamos refletir quanto as afirmativas acima enquanto combinamos que para nosso estudo seguiremos por três enfoques de correntes filosóficas tecnológicas diferentes. São eles:
1 - Enfoque Analítico de Mário Bunge;
2 - Enfoque Fenomenológico de Albert Borgmann, descrito no livro "Technology and the caracter of contemporary life" de 1984;
3 - Enfoque da Filosofia Crítica da escola de Frankfurt, de Andrew Feenberg, descrito no livro "Transforming technology"de 2002.

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